Havia o caminho, a curva e o precipício. Numa árvore próxima, uma coruja.

Veio o coelho apressado. Discretamente acena para a coruja e desaparece na curva. Logo volta enfurecido:

- Como você não me alertou? Quase sucumbi, e você aí indiferente!

- Não é minha função – justifica-se a coruja.

Nisso, vem ligeira a ovelha, muito alegre, preparada para uma festa. Cumprimenta o coelho e a coruja e dobra a curva do caminho.

Suja e revoltada, reaparece, interpelando os colegas:

- Como vocês não me alertaram, estraguei minhas vestes e quase perdi a vida!

- Pois é, ela também não me avisou – diz o coelho virando-se para a coruja, que se limita a dizer:

- Não é minha função...

Nisso, vem chegando um potrinho muito fagueiro e, ao ver a discussão, aproxima-se com olhar compassivo, querendo saber o que havia acontecido.

Diz o coelho:

- Essa coruja é irresponsável!

A ovelha acrescenta:

- Não se pode confiar em coruja!

E a coruja, impassível, apenas repete:

- Não é minha função...

O potrinho, sentindo que nada podia fazer, despede-se amigável:

- Tenho compromisso, até breve.

Os bichos continuaram em discussão, e o potrinho dobra a curva do caminho.

Logo ouve-se um grito... e o silêncio.

O coelho e a coruja olham em direção à curva, e nada. Fixam-se então na coruja com olhar condenatório. E esta, imperturbável:

- Não é minha função...

Ninguém é culpado...

Ou a culpa é do potrinho?!

Visão e Parábolas (livro esgotado)
Francisco Gomes de Matos
Editora Campus